Os resultados econômicos do ano passado, por se tratar de
ano eleitoral, em grande parte vão ao encontro do que é esperado pelo que se
convencionou chamar na literatura econômica de ciclos políticos de negócios.
Esta teoria, iniciada pelos estudos de Downs (1957) e Nordhaus (1975), ganhou
diferentes abordagens e desenvolvimentos ao longo do tempo – como a
incorporação de expectativas racionais, por exemplo. Com isso, podemos resumir
os esforços de pesquisa nessa área de fronteira entre economia e política da
seguinte forma: o governo direciona a
política econômica de modo a maximizar seus votos e a favorecer as classes que
o mantém no poder.
Os resultados empíricos relacionados a essa área vão no
sentido de comprovar a existência de ciclos, que tem como pressupostos a expansão dos gastos públicos, aumento da inflação, redução do desemprego e aumento na emissão de moeda em ano de
eleição, tendo em vista que o objetivo é a maximização de votos e levando em
consideração a hipótese de miopia
política, onde os eleitores só são capazes de enxergar o passado recente
dos resultados econômicos.
Para o caso do Brasil, especificamente do ano de 2014,
pudemos observar que 3 dos pressupostos para a comprovação dos ciclos foram
satisfeitos, exceto o aumento na emissão de moeda. O governo abandonou a meta
fiscal no final do ano e o resultado primário de 2014 foi deficitário em 0,63%
do PIB, a inflação quase atingiu o limite superior da meta estabelecida pelo
Banco Central, terminando o ano em 6,41% e em contrapartida obtivemos um nível
historicamente baixo para a taxa de desemprego medida pela PME (IBGE) – média
de 4,8% no ano.
O aumento na emissão
de moeda, nesse sentido, está diretamente relacionado ao chamado viés
inflacionário, que é basicamente a existência de estímulos para que os policy makers inflacionem o sistema a
fim de buscar maiores níveis de produto e emprego. Porém, há uma especificidade
no caso brasileiro que é o movimento de alta na taxa de inflação, que por sua
vez, requer respostas contracionistas de política monetária com o intuito de
mitigar o problema.
Desde 1999, o Banco Central do Brasil adotou o regime de
metas para inflação, que por sua vez é um arranjo institucional que tem como
objetivo eliminar alguns problemas relacionados à política monetária –
inconsistência temporal, viés inflacionário, etc – e permitir um ganho de
credibilidade por parte do BC, que pode ser capaz de reduzir a inflação a um
custo menor, por conta da maior capacidade de conduzir as expectativas dos
agentes econômicos.
Uma definição mais precisa de credibilidade da autoridade
monetária:
“Para que se desenvolva a credibilidade é preciso, em um primeiro
momento, que o responsável pela condução da política econômica conquiste
reputação. Para tanto, é necessário que os agentes econômicos acreditem que uma política
anunciada para um determinado instante no tempo seja implementada com êxito. Ou
seja, o anúncio de uma política econômica a ser colocada em prática contará com
credibilidade se o público espera chance reduzida de ocorrência de
inconsistência temporal”. (Mendonça, 2002)
A partir dessa definição, podemos imaginar que a autoridade
monetária tem maior credibilidade quando é capaz de cumprir com a meta
pré-estabelecida. Para ilustrar o caso brasileiro, temos dados sobre a inflação
observada e a meta de inflação – e suas bandas de flutuação – de 2002 a 2014:
Fonte: IBGE/Banco Central do Brasil. Elaboração própria. |
Com base no gráfico acima, podemos inferir que com a
inflação acima do centro da meta desde 2009 e até mesmo chegando a atingir o
teto da meta - 6,5% - no ano de 2011, a autoridade monetária vem perdendo
reputação e com isso, os esforços de política monetária tem menos
credibilidade. Menos credibilidade implica em um maior custo para
desinflacionar a economia.
O principal instrumento à disposição do Banco Central para
fazer com que a inflação convirja para a meta estabelecida é a taxa de juros
básica da economia (SELIC). De acordo com as análises empíricas da mensuração da
credibilidade da autoridade monetária no Brasil, quanto menos crível for a
política monetária, maior será o esforço do Banco Central para a obtenção da
meta pré-estabelecida, por conta da menor capacidade de influenciar as
expectativas dos agentes econômicos.
Isso implica que, uma credibilidade menor pressupõe, ceteris paribus, uma maior
volatilidade da taxa de juros para que se consiga atingir a meta estabelecida.
Isso é evidenciado quando analisamos o caso brasileiro
recente. Observando a evolução mensal da meta para a taxa SELIC de janeiro de
2010 até dezembro de 2014, podemos notar a volatilidade dos juros básicos
brasileiros e também perceber a tendência de alta de meados de 2013 até o final
de 2014, refletindo o maior custo de desinflacionar a economia:
Fonte: Banco Central do Brasil. Elaboração própria. |
Para ilustrar esse custo maior de
controlar a inflação por conta da perda de credibilidade da autoridade
monetária, podemos observar a variação mensal da inflação medida pelo IPCA
(IBGE) de janeiro de 2010 até dezembro de 2014:
Fonte: IBGE. Elaboração própria |
Como podemos perceber da análise dos dois gráficos
conjuntamente, não existe uma correlação negativa imediata entre a taxa de
juros e a inflação, ou seja, o aumento da taxa de juros em um mês não implica
uma queda da inflação no mês seguinte. Isso decorre da defasagem externa da política monetária. Em outras palavras, a
defasagem externa da política monetária pode ser entendida como o tempo que
transcorre entre a ação da política e os seus efeitos sobre a economia.
Com base no boletim Focus divulgado em 16 de janeiro, as
expectativas de mercado para a inflação de 2015 passaram de 6,49% para 6,72% e, para 2016, de 5,70% para
5,60%. Foi isso o que motivou a 188ª reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM)
a elevar a taxa SELIC de 11,75 p.p. para 12,25 p.p. sem viés. A última ata do COPOM
também deixa claro que o Banco Central espera uma inflação acima da meta em
2015 e que haja uma convergência para a meta de 4,5 p.p. apenas no ano de 2016.
Sendo assim, baseando-se na evolução recente das variáveis macroeconômicas, o
Banco Central tem que trabalhar com o objetivo de ganhar credibilidade, de modo
que consiga convergir a inflação para a meta sem precisar de grandes aumentos
na taxa de juros – como acontece hoje – porque isso se reflete em maior custo
do capital, afugentando investimentos e contribuindo para que tenhamos
resultados pífios em termos de crescimento econômico.
Referências:
ARAÚJO, J.M.; FILHO, P.A. Ciclos político-econômicos: uma
análise do comportamento dos gastos públicos nos estados brasileiros no período
de 1995 a 2008. XXXVIII Encontro Nacional
de Economia – ANPEC 2010.
DORNBUSCH, R.; FISCHER, S. Macroeconomia. 5ª edição.
MENDONÇA, H.F. “A teoria da credibilidade da política
monetária”. Revista de Economia Política,
vol. 22. 2002.
MENDONÇA, H.F. “Mensurando a credibilidade no regime de metas
inflacionárias no Brasil”. Revista de
Economia Política, vol. 24. 2004.
MENDONÇA, H.F.; GUIMARÃES E SOUZA, G.J. “Credibilidade do
regime de metas para inflação no Brasil”. Pesquisa
e Planejamento Econômico, vol. 37. 2007.
*Graduando em Economia-UFF
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